segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

TONGA DA MIRONGA DO CABULETÊ


O significado na lingua NAGÔ da expressão

"na tonga da mironga do cabuletê"

e seu uso na letra da música de mesmo nome é bem próprio do espírito livre e travesso do poetinha Vinicius de Morais que deve ter rido muito cantando isso!


1970

Vinícius e Toquinho voltam da Itália onde tinham acabado de inaugurar a parceria com o disco “A Arca de Noé”, fruto de um velho livro que o poetinha fizera para seu filho Pedro, quando este ainda era menino.

Encontram o Brasil em pleno “milagre econômico” da ditadura militar. A censura em alta e a Bossa em baixa.

Opositores ao regime pagando com a liberdade e a vida o preço de seus ideais.

O poeta é visto como comunista pela cegueira militar, e ultrapassado pela intelectualidade militante que, pejorativa e injustamente, classifica sua música de "easy music".

No teatro Castro Alves, em Salvador, é apresentada ao Brasil a nova parceria. Vinícius está casado com a atriz baiana Gesse Gessy, uma das maiores paixões de sua vida, que o aproximaria do candomblé, apresentando-o à Mãe Menininha do Gantois.

Sentindo a angústia do companheiro, Gesse o diverte, ensinando-lhe xingamentos em Nagô, entre eles:

“tonga da mironga do cabuletê”,

que significa

“o pêlo do cu da mãe”.

O mote anal e seu sentimento em relação aos homens de verde-oliva inspiram o poeta.

Com Toquinho, Vinícius compõe a canção para apresentá-la num show no Teatro Castro Alves. Era a oportunidade de xingar os militares sem que eles compreendessem a ofensa. E o poeta ainda se divertia com tudo isso:

“Te garanto que na Escola Superior de Guerra
não tem um milico que saiba falar nagô”.
_____________________
Fonte: Vinicius de Moraes: o Poeta da Paixão; uma Biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 1994.

Veja a letra da inspirada canção da dupla Vinicius e Toquinho:

Tonga da Mironga do Cabuletê

Eu caio de bossa, eu sou quem eu sou
Eu saio da fossa, xingando em nagô
Você que ouve e não fala
Você que olha e não vê
Eu vou lhe dar uma pala,
Você vai ter que aprender
A tonga da mironga do cabuletê
A tonga da mironga do cabuletê
A tonga da mironga do cabuletê
Você que lê e não sabe
Você que reza e não crê
Você que entra e não cabe
Você vai ter que viver
Na tonga da mironga do cabuletê
Na tonga da mironga do cabuletê
Na tonga da mironga do cabuletê
Você que fuma e não traga
E que não paga pra ver
Vou lhe rogar uma praga
Eu vou é mandar você
Pra tonga da mironga do cabuletê
Pra tonga da mironga do cabuletê
Pra tonga da mironga do cabuletê

domingo, 23 de janeiro de 2011

Olímpíadas no Rio - 2016

Previsões de Pai José Simão

1. ONGs vão pipocar dizendo que apóiam o esporte, tiram crianças das ruas e as afastam das drogas. Após as olimpíadas estas ONGs desaparecerão e serão investigadas por desvio de dinheiro público. Ninguém será preso ou indiciado.

2. Um grupo de funk vai fazer sucesso com uma música que diz: vou pegar na tua tocha e você põe na minha pira.

3. Uma escola de samba vai homenagear os jogos, rimando “barão de coubertin” com “sol da manhã”. Gilberto Gil virá no último carro alegórico vestido de lamê dourado representando o “espírito olímpico do carioca visitando a corte do Olimpo num dia de sol ao raiar do fogo da vitoria”.

4. Haverá um concurso para nomear a mascote dos jogos que será um desenho misturando um índio, o sol do Rio, o Pão de Açúcar e o carnaval, criado por Hans Donner. Os finalistas terão nomes como: “Zé do Olimpo”, “Chico Tochinha” e “Kaíque Maratoninha”.

5. Luciano Huck vai eleger a Musa dos jogos, concurso que durará um ano e elegerá uma modelo chamada Kathy Mileine Suellen da Silva.

Abertura dos jogos


1. A tocha olímpica será roubada ao passar pela baixada fluminense. O COB vai encomendar outra com urgência para um carnavalesco da Beija flor.

2. Zeca Pagodinho, Dudu Nobre e a bateria da Mangueira farão um show na praia de Copacabana para comemorar a chegada do fogo olímpico ao Rio. Por motivo de segurança, Zeca Pagodinho será impedido de ficar a menos de 500 metros da tocha.

3. Durante o percurso da tocha, os brasileiros vão invadir a rua e correr ao lado dela carregando cartolinas cor de rosa onde se lê GALVÃO FILMA NÓIS, 100% FAVELA DO RATO MOLHADO.

4. Pelé vai errar o nome do presidente do COI, discursar em um inglês de merda elogiando o povo carioca e, ao final, vai tropeçar no carpete que foi colado 15 minutos antes do início da cerimônia.

5. Claudia Leite e Ivete Sangalo vão cantar o “Hino das Olimpíadas” composto por Latino e MC Medalha. As duas vão duelar durante a música para aparecer mais na TV.


6. O Hino Nacional Brasileiro será entoado a capella por uma arrependida Vanuza, que jura que "não bota uma gota de álcool na boca desde a última copa". A platéia vai errar a letra, em homenagem a ela, chorar como se entendesse o que está cantando, e aplaudir no final como se fosse um gol.

7. Uma brasileira vai ser filmada varias vezes com um top amarelo, um shortinho verde e a bandeira dos jogos pintada na cara. Ela posará para a Playboy sem o top e sem o shortinho e com a bandeira pintada na bunda.

8. Por falta de gás na última hora, já que a cerimônia só foi ensaiada durante a madrugada, a pira não vai funcionar. Zeca Pagodinho será o substituto temporário já que a Brahma é um dos patrocinadores. Em entrevista ao Fantástico ele dirá que não se lembra direito do fato.

9. Setenta e quatro passistas de fio-dental vão iniciar a cerimônia mostrando o legado cultural do Rio ao mundo: a bala perdida, o trafico, o funk, o sequestro-relâmpago e a favela.

10. Durante os jogos de tênis a platéia brasileira vai vaiar os jogadores argentinos obrigando o árbitro a pedir silencio 774 vezes. Como ele pedirá em inglês ninguém vai entender e vão continuar vaiando. Galvão Bueno vai dizer que vaiar é bom, mas vaiar os argentinos é melhor ainda. Oscar concordará e depois pedirá desculpas chorando no programa do Gugu.

11. Um simpático cachorro vira-lata furará o esquema de segurança invadindo o desfile da delegação jamaicana. Será carregado por um dos atletas e permanecerá no gramado do Maracanã durante toda a cerimônia. Será motivo de 200 reportagens, apelidado de Marley, e será adotado por uma modelo emergente que ficará com dó do pobre animalzinho e dirá que ele é gente como a gente.

12. Adriane Galisteu posará para a capa de CARAS ao lado do grande amor da sua vida, um executivo do COB.

13. Os pombos soltos durante a cerimônia serão alvejados por tiros disparados por uma favela próxima e vendidos assados na saída do maracanã por “dois real”.

Durante os jogos

1. Caetano Veloso dará entrevista dizendo que o Rio é lindo, a cerimônia de abertura foi linda e que aquele negão da camiseta 74 da seleção americana de basquete é mais lindo ainda.

2. Uma modelo-manequim-piranha-atriz-exBBB vai engravidar de um jogador de hóquei americano. Sua mãe vai dar entrevista na Luciana Gimenez dizendo que sua filha era virgem até ontem, apesar de ter namorado 74 homens nos últimos seis meses, e que o atleta americano a seduziu com falsas promessas de vida nos EUA. Após o nascimento do bebê ela posará nua e terá um programa de fofocas numa rede de TV.

3. No primeiro dia os EUA, a China e o Canadá já somarão 74 medalhas de ouro, 82 de prata e 4 de bronze. Os jornalistas brasileiros vão dizer a cada segundo que o Brasil é esperança de medalha em 200 modalidades e certeza de medalha em outras 64.

4. Faltando 3 dias para o fim dos jogos, o Brasil terá 3 medalhas de bronze e 1 de ouro, esta ganha por atletas desconhecidos no esporte “caiaque em dupla”. Eles vão ser idolatrados por 15 minutos (somando todas as emissoras abertas e a cabo) como exemplos de força e determinação. A Hebe vai dizer que eles são “uma gracinha” ao posarem mordendo a medalha, e nunca mais se ouvirá deles.

5. A seleção brasileira de futebol comanda por Ronaldo Fenômeno vai chegar como favorita. Passara fácil pela primeira fase e entrará de salto alto na fase final, perdendo para seleção de Sumatra.

6. A seleção americana de vôlei visitará uma escola patrocinada pelo Criança Esperança. Três meninos vão ganhar uma bola e um uniforme completo dos jogadores, sendo roubados e deixados pelados no dia seguinte.

7. Os traficantes da Rocinha vão roubar aquele pó branco que os ginastas passam na mão. Um atleta cubano será encontrado morto numa boate do Baixo Leblon depois de cheirá-lo. O COB, a fim de não atrasar as competições de ginástica, vai substituir o tal pó pelo cimento estocado nos fundos do ginásio inacabado.

8. Um atleta brasileiro nunca visto antes terminará em 57º lugar na sua modalidade e roubará a cena ao levantar a camiseta mostrando outra onde se lê: JARDIM MATILDE NA VEIA.

9. Vários atletas brasileiros apontados como promessa de medalha serão eliminados logo no inicio da competição. Suas provas serão reprisadas em 'slow motion' e 400 horas de programas de debate esportivo vão analisar os motivos das suas falhas.

Após os jogos

1. Um boxeador brasileiro negro de 1,85m estrelará um filme pornô para pagar as despesas que teve para estar nos jogos e por não obter patrocínio.

2. Faustão entrevistará os atletas brasileiros que não ganharam medalhas. Não os deixará pronunciar uma palavra sequer, mas dirá que esses caras são exemplos no profissional tanto quanto no pessoal, amigos dos amigos, e outras besteiras.

3. No início do ano seguinte, vários bebês de olhos azuis virão ao mundo e as filas para embarque nos voos para a Itália, Portugal e Alemanha serão intermináveis, com mães "ofendidas", segurando seus rebentos...


Muito bom, pena ser tão triste por parecer tanto com a verdade...

sábado, 8 de janeiro de 2011

Bons Conselhos - Reflita


A vida não deve ser uma viagem para o túmulo, com a intenção de chegar lá são e salvo, com um corpo atraente e bem preservado.,(boa!) Melhor enfiar o pé na jaca - Cerveja em uma mão - tira gosto na outra - muito sexo e um corpo completamente gasto, totalmente usado, gritando: VALEU !!! QUE VIAGEM!!!

Lembre que

- SE CAMINHAR FOSSE SAUDÁVEL O CARTEIRO SERIA IMORTAL...!
- BALEIA NADA O DIA INTEIRO, SÓ COME PEIXE, SÓ BEBE ÁGUA E É GORDA....!
- COELHO CORRE, PULA E VIVE 15 ANOS, TARTARUGA NÃO CORRE NÃO FAZ NADA E VIVE 450 ANOS !!!!

"Se você não encontrar sua metade da laranja, não desanime, procure sua metade do limão, adicione açúcar, pinga e gelo e vá ser feliz!"

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

A Revolucionária e a Presidente


O sol anunciava que iria se recolher, mas isto de nada intimidava os presentes. As paredes do planalto eram testemunhas do burburinho instalado. Era a festa da nova era. Políticos, pilantras e outras celebridades eram lambidos pelos flashes das varias câmeras presentes. "Uma palavrinha... uma palavrinha..." gritavam alguns, outros, mais perdidos, observavam como se ali não estivessem.

Um banquete, sem duvida um brinde ao desperdício. Rei morto rei posto, pensava a Revolucionária, quem dera, mais parece muito mais do mesmo de sempre. A redundância da soberba a enfadava. Seguia perdida pelos salões abarrotados, não estava claro o porquê ela aceitara acompanhar a Amiga, o porquê aceitara viver para sempre como testemunha daquele horror.

Não se trata de rivais, mas passou que minutos depois a Revolucionaria e a Amiga pararam diante do bigode branco mais cínico do salão. O coronel esforçava-se para ser simpático, mas sua natureza mostrava dificuldades em assim proceder. A violência implícita em sua forma de ser escapava por alguns segundos, depois, astuto como uma raposa, a disfarçava entre risos cínicos e bocejos.

- Veja só quem por aqui permanece - Disse a Amiga - Há uns que só sairão mortos daqui.

- Compadeço mais com aqueles muitos, regidos por ele, que nem a mínima idéia tem que este lugar existe. Quisera eu e meu estomago essa inocência de volta.

As jovens acompanhavam a entrevista a um braço de distancia do Coronel. O comentário das mesmas foi ouvido pelo repórter do programa humorístico. O mesmo teve a idéia de propor, ao vivo, que Revolucionaria fizesse uma pergunta ao Coronel. A menina se viu diante daquele bigode branco, a lhe sorrir com a paciência dos populistas. O que se viu a seguir foi um show de civilidade, onde moça e raposa duelaram na palavra temas duros e polêmicos, tal como habilidosos jogadores de uma partida invisível a olhos desavisados.

Assim como acontece em partidas de jogos em geral, aquele que perde a sanidade parte sempre para a violência. Em questão de segundos o país assistia em rede nacional um vexame. O Coronel, irritado com tudo mandou prender a todos, menina, repórteres e parte do público. Homens de braços grandes e ternos pretos passaram a arrastar quem o Coronel havia indicado. O mesmo esquecera-se de mero detalhe, tudo o que passava era retransmitido em rede nacional e em tempo real.

A Revolucionaria ardeu em raiva quando a agarraram pelo braço. Estava com tanta raiva que seria capaz de, com uma pinça, retirar um por um dos fios cínicos daquele bigode. Gritou como se seus pulmões ganhassem voz e seu fígado pudesse limpar parte da sujeira daquele salão.

- Serei então presa, em plena festa da democracia, pelo bigode branco mais cínico deste salão imundo. Bravo. Que o Coronel vá cumprimentar com sua mão suja a Presidente. Que esses dedos, que ajudaram a torturá-la tempos atrás, agora se ofereçam para servi-la. Déspota, tirano, não sabes falar outra língua que não seja a de seus interesses e suas violências. Mas fala em uma língua provinciana Coronel, seus dias estão contados. Figuras grosseiras como você são responsáveis por desesperados como eu, que rogam para que parem.

Nisso toca o telefone em um salão de veludo. "é Ele, é Ele..." zumbiam os rumores. A Presidente é localizada em uma roda de apertos de mãos. Atende, sua expressão é um misto de quem recebe uma ordem com a tranqüilidade de quem ouve um guru. Minutos depois ela pede um assessor, três vem ao seu auxilio carregando tudo que ela precisa um laptop e fones de ouvido. A mesma se intera do que passa no saguão e recebe coordenadas das raposas mais competentes do planalto. Devidamente informada distribui funções e tarefas, programa que em quinze minutos, na sala presidencial, receberá a Revolucionaria, mas o fará como mulher, depois irá se pronunciar como presidente.

A manchete rola pelo país. Todos querem saber mais sobre a audaciosa guria que desacatou uma autoridade, discursou para as câmeras, foi presa e agora será recebida pela presidente. Pela internet a noticia se espalhou. O assunto dominava os TTs do Twitter, e o perfil da moça nas redes sociais foi um zilhão de vezes visitado. Seus amigos davam entrevistas, seus parentes eram localizados. Parte da família estava horrorizada, outra parte gritava em brados, felizes pelos valores e pela mensagem deixada. Sentiam que a moça vivia sua própria história e que cada um recebera de deus um tempo para atuar, e seus braços para escolher como se comportar.

A Mãe era próxima, conhecia-a com o saber que apenas as que carregaram no ventre podem ter. Chamou a Amiga pelo telefone que confirmou os rumores. A Revolucionária estava presa, mas anunciavam o futuro encontro com a Presidente. Ela havia encontrado na multidão uma amiga em comum, que estudara com elas. A Mãe reconheceu a Amiga, e ficou sabendo que a mesma já estava próxima ao local em que a Revolucionaria estava presa, junto com outros repórteres. A mesma se utilizaria do fato de ser da imprensa para chegar até a Revolucionaria e entregar-lhe seu celular. A Mãe se tranqüilizou, a Amiga garantiu que alta noite a Mãe já falaria com a filha. Despediram-se.

Na cela se ouvia muita gritaria e tumulto. Parece que haviam danificado a câmera e que o barulho ofuscara a noite de gala. A Revolucionaria assistia os homens gritarem em um canto quando reconheceu um par de óculos e seu penteado clássico. Aproximou-se das grades rindo e disse:

- Me da um cigarro.

A repórter, rindo respondeu - onde aprendeste a enfrentar autoridades em jantares públicos?

- Sabes bem de onde venho, porque juntas fomos criadas, e nossos seres respiram na mesma estrada, como cúmplices ou irmãos - Disse a Revolucionaria quase com riso - É bom ver uma figura conhecida. Sabes o que me irá suceder?

- Venho justamente pelo jornal, te trouxe um celular, teu celular, e te aviso que parece que a Presidente irá te receber.

- A todos?

- Não. Somente a ti.

- Parece que este circo não se cansa de girar.

- Te peço que me informe. Guarde meu numero e me comunique seja o que for, peço-te uma exclusiva, que assim me ajudas, e ao mesmo tempo da-me o prazer de participar de mais este feito da noite.

- Pois vejo que te tornaste eficiente repórter, e como irmão de berço te farei o que precisares. Peço-te então que administre o que irá passar, pois imagino que já se deve circular ai a noticia. Sabes o que foi que fizeram do miserável de bigodes?

- Retirou-se em seguida. Parece que já havia estado no salão com todos e estava de saída naquele momento.

Diferente da forma bruta que a Revolucionaria havia entrado naquela sala de grades, agora era gentilmente convidada a sair. Iriam direto a sala da Presidente. Como eram ridículos os protocolos e odes depois que se foi aviltado momentos antes. A moça se ria e chorava por dentro. Vertia em lagrimas internas a sua constante perda de inocência. Sabia que queria saber mais, tinha sede de saber. Mas aquele saber, tão cheio de domínio, sobre o que se havia de mais atual na malicia, este saber era nocivo para uma alma de paz.

A sala era suntuosa, rica em detalhes e adornos. Ao fundo havia uma janela larga, quase tão larga como a grande mesa e as cadeiras logo à frente. Do outro lado da mesa havia uma mulher de faces rubras e olhos ligados. A porta se fechou lentamente após um sinal feito com a mão da Presidente. Deixaram-nas a sós. Existia, naquela artificial ocasião, uma vontade secreta de ser honesto. Duas mulheres em uma sala, duas estrelas a sós em meio a um espetáculo voraz a espreitá-las por fechaduras.

Frente a frente, trocaram mais olhares que palavras em um primeiro momento. A Presidente, como boa anfitriã iniciou a conversa:

- Faz-me lembrar do tempo em que almoçava coragem para jantar sonhos.

- Em teus sonhos não imaginava apertar a mão e governar ao lado dos que contribuíram para teu horror e penar? - Falou a moça

- Que pergunta mais sentimental. Acaso acreditas em céu e inferno também?

- Quais deles se refere à Presidente? O céu dos cantadores e o inferno dos demônios? O céu de enfados e o inferno das perdições? Ou talvez faça referencia ao céu da paz de espírito e o inferno que são os tormentos da alma.

O telefone da Revolucionaria tocou. A Presidente consentiu que a mesma atendesse. Tratava-se de sua Amiga e a Repórter. A menina fez com sinais que trocaria algumas palavras, a Presidente alcançou um telefone e fez o mesmo. Combinaram em códigos quase cifrados que a Revolucionaria manteria o telefone ligado em seu colo, assim teriam elas como gravar e acompanhar o que se passava naquele escritório.

A moça fingiu desligar o telefone, a Presidente colocou a chamada no viva voz, era Ele. Sua voz peculiar e seus gracejos não deixavam dúvidas, era mesmo Ele. Falou por quase dez minutos. Às vezes fazia que parava, mas retomava com fôlego e ressuscitava seu discurso. Falava bem, de fato, tanto sucesso não era por menos.

Em menos de dez minutos caíram às paredes daquele escritório, tudo que se passava por lá era publicamente dividido por vídeos, sons e texto. Haviam trechos do dialogo traduzidos para doze idiomas em sites de grandes jornais mundo a fora quando ficou claro que a informação vazara por duas vias.

A Presidente terminava seus assuntos com Ele quando foi interrompida pelas noticias frescas. Seguiram o plano inicial, quase um protocolo. A Presidente mudou de face, metamorfose nata que passa a todo lobo que vive em pele de cordeiro. Tão logo me fitou pela ultima vez nos olhos e disse - Iras aprender com o tempo que quando se fala em poder morre a idéia de privacidade, moral e inocência.

Foram direto para o saguão da esplanada. A corrente de assessores e seguranças deixavam claro que a moça deveria caminhar com eles, lado a lado da Presidente. Foram juntos até o palanque onde a menina foi colocada sentada em uma cadeira central. A Presidente estava a sua direita, discursava. Durante aquela fala tudo ficou claro, todo o jogo e o presente. Aquela mulher sabia que de outra forma a Revolucionaria não ficaria para assistir aquele teatro até o final, sabia que se tratava de uma estrangeira. Fez de forma que não houvesse escapatória para a quase refém convidada.

Por fim chegou à vez de exibir a caça e fazer com que o segundo sol da noite brilhasse. Tal qual um bife passa do açougue, cozinha, panela, para enfim estar no prato, à moça veio como prato saído do forno, para frente das câmeras. Ao lado da Presidente ouviu o mesmo que a multidão que gritava:

- A festa da democracia não será manchada com prisões que beiram o abuso de poder. Esta casa é o templo do dialogo, e é este e não outro que aqui governará. - Em seguida parava para poses e gritos, então prosseguia - São livres todos os homens e mulheres, e assim seguirão dentro do respeito e da cordialidade, que é o que queremos para todo o país.

Um repórter intrometido gritou perguntando-lhe o que pensava da atitude do deputado Coronel. A mesma reiterou a idéia de liberdade. Aquela situação golpeava a moça de corpo e alma. Os amigos acompanhavam suas suplicas silenciosas de perto, os outros poderiam ver o mesmo de qualquer ciber café. Pedia que parasse. Foi quando outro repórter astuto perguntou sobre o que disse a menina que fora apelidada de Revolucionaria pela imprensa. Foi então que novamente o estomago da moça ardeu e a Presidente disse:

-Há correntes que pensam de forma retrograda, interagem com o ambiente da maneira que podem, são violentas por natureza. Eu tão bem conheço suas entranhas, e disso todos sabem. A jovem que fui hoje está aqui ao meu lado. E como lhe disse como amiga e mulher repito agora como Presidente: Sob a minha guarda não haverá cárcere para aqueles que berram por justiça.

Foi o delírio do povo. Até fogos de artifícios eram lançados. Tratava-se do epicentro do pão e circo. Nunca mais a Presidente se dirigiu a moça. O protocolo terminara e a festa, enfim, seguiria como coquetel.

As três meninas caminharam silenciosamente pelo gramado. O entorno era de luz, mas naquela noite se assemelhava a ruínas. Sentaram de frente para o prédio, admirando o famoso cartão postal de Brasília. Um gosto árido no ar refrescava as cabeças que corriam em pensamentos acelerados.

A Repórter tirou da bolsa um computador e um baseado. Sentaram e fumaram juntas. Contaram anedotas, riram lembrando-se de dias em comum, falaram um pouco da noite, da vida, e dos planos. Estavam abrindo a segunda garrafa de vinho quando começaram a pesar os efeitos daquela noite no mundo. O que antes pareciam três moças a beber, agora eram três fortalezas. Cada uma seguia sua analise por um viés e a cada dado novo conseguiam desenhar no ar a gravidade do que estavam vendo.

A popularidade da Presidente havia crescido vinte por cento em apenas duas horas, e tal pesquisa havia sido feita com jovens. A Revolucionaria então pediu para gravar um depoimento, e assim o fizeram:

- Nada, absolutamente nada. Nem mesmo um arranhão em todo este jogo. O escândalo serviu apenas para entreter, ajudou a colorir a cortina de fumaça que está muito mais em baixo. A popularidade é uma espécie de lucro, de paz, e de informação. Avisa a eles que sim, estão cegos, e não podem enxergar o que fomos agora obrigadas a ver. Mesmo eles não passando de escravos de suas ambições egoísta, mais pobres somos nós que os deixamos ai. São o mais amargo dos reflexos de nosso rosto, de nós. Qualquer um dos presentes esta noite não são nem amigos nem inimigos, são irmãos. Aquele que aqui esteve e algo entendeu, plantou aqui sua inocência ou a perdeu.

A Amiga percebeu o tamanho da aflição. Por muitas vezes queremos curar as feridas dos que nos rodeiam, mas no geral não podemos muito fazer. Naquela noite, tudo que poderia fazer era estar junto. Aqueles que vivem juntos na jornada da vida inventam e aprendem línguas próprias. Naquele momento falariam a língua do "tudo bem". Eram raros os momentos que se falava esta língua, em geral todos quando se estava à beira da exaustão. Concordaram que era bom momento para ir dormir, dormir e deixar o mundo adormecer.

autoria Anne Feingold

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